A crucificação como símbolo
Nos últimos 2 meses o tema das cruzadas invadiu-me e o seu estudo acompanha-me através de variadas fontes. Ao longo dos tempos, dos ciclos que se movem com os mesmos padrões, numa lógica difícil de integrar na consciência - porque tão facilmente se esvai da memória - homens usaram as suas mãos para matar outros homens. A guerra é motivo de estudo nas escolas, mas é profundamente errado ensiná-la aos mais jovens, é um género de anestesia mental. Estuda-se para se esquecer. A história da guerra deve ser contada em todas as universidades e ao longo de todas as idades! A guerra nasce da amnésia, de formas de pensamento rígidas, da ignorância, sempre assim foi e sempre assim será.
O trauma dos impérios é matéria que se deve decorar pois a ignorância está à vista, basta olhar o palco do mundo e o modo como as pessoas se localizam nesse palco. As estratégias mudam, o trauma é o mesmo. A civilização foi ao longo do tempo dividida em civilizações e é do interesse da máquina de guerra que esta fragmentação da humanidade se mantenha. Divididos os mundos nas suas diferenças, mantidos eles nas suas crenças ... o mesmo que dizer, sustentados os mundos no medo de deixar de ser o que são nas suas ideias. Houve momentos na história onde a diferença foi entendida como algo bom, na Idade Média em Toledo por exemplo. Hoje, impressionantemente, o ódio à cultura diferente retorna com toda a força, é o mesmo padrão de sempre. é verdadeiramente assustador escutar as mesmas frases de há 100 anos atrás, de há mil anos atrás, de há dois mil anos atrás.
Este é o ponto: Como surge uma ideia? De onde ela vem? Da memória. Que memória? Aquela que contém a justificação da ideia. Se a ideia é verdadeira? Pouco importa, o que importa é a sua justificação imediata. Por isso a história serviu ao longo do tempo de instrumento de persuasão, sendo moldada na medida do interesse próprio. Assim foi criada a história de Jesus no século IV, séculos após a sua morte. A sua história contada por uns, serviu para dividir mundos. É bom que se estude bem as loucuras do Império Romano para entender que não é porque a história está escrito num livro que é verdadeira. Muitos livros se queimaram, outros esconderam para ser descobertos em 1945 como os Manuscritos do Mar Morto e outros estão por descobrir ainda.
Porque se queimaram tantos livros ao longo dos tempos? Porque a verdade de nada interessa quando se quer invadir um território, seja ele mental ou material. Para justificar uma ideia aniquila-se a verdade - assim se enchem as barrigas de porquês - para que a razão mate sem dó nem piedade. No tempo das cruzadas nasciam as universidades na Europa e a revolução aristotélica trouxe o casamento da fé com a razão. Mulheres da mesma altura, as místicas, falavam, escreviam e ensinavam acerca do casamento da fé com o amor. O ponto alto foi a Marguerite Porete que acabou por ser vítima da inquisição em 1310 porque escreveu um livro que tirava à razão todo o tipo de argumentos - "O Espelho das Almas Simples", um livro genial! A cultura daquelas mulheres floresceu de um modo impressionante a par daquele que considero ser o maior trauma neste território europeu - as cruzadas. O que está à vista hoje no Médio Oriente é "mais uma" cruzada.
Chegados à terra santa, com aquela cruz ao peito, selvagens mataram todos os muçulmanos e judeus. E mataram também os cristãos que se recusavam dizer onde estava a verdadeira cruz da crucificação. Mataram-nos como mataram os cátaros, as primeiras vítimas da inquisição, e assim "cristãos" matavam cristãos. Este é o trauma dos impérios - matar para uniformizar, dominar e depois ... voltar a matar. Até que o império começa a encolher e se transfere para outro lugar, como um vírus ... Onde está ele agora? ... Romano, Persa, Árabe, Germânico, Português, Espanhol, Inglês, Francês, Nazi, Soviético, Americano ... até quando? O antagonismo é asfixiante.
Porque o amor não venceu e foi ao longo dos tempos crucificado estamos hoje, ainda, a viver a repetição do padrão, que na verdade, é simples de entender, mas tremendamente difícil de sentir. Ter os olhos postos na verdade é o mais difícil para a Humanidade e por isso ela distrai-se.
Pensar positivo não é apagar a história, é integrá-la e curá-la. Pensar positivo é saber que se tem dentro de si tudo o que é necessário para findar os erros do passado. Se a Fé existe é para nos dar foco nesse poder interior, que cessa as ilusões da morte. Quando todos tivermos desperta a sensibilidade para entender que a morte não aniquila a vida então teremos a ciência perfeita para casar a razão com o amor. Assim Yeshua morreu na plena consciência que estava ali a criar um símbolo para o trauma dos impérios, o trauma da humanidade. Mas da mesma forma que criou esse símbolo, criou também no corpo da humanidade a Sua Presença que se move misteriosamente e ininterruptamente. Está em todos nós, quer o saibamos ou não. Como o sopro e a água, está em todos os elementos pois a sua matéria fez-se matéria da Terra inteira.
A minha Fé não nasceu de nenhuma crença pois aprendi que se acreditar em algo estou a fragmentar-me dessa Inteireza, ouvi-o do Sadhguru e gravei em mim pois o seu sentido é todo! Tenho Fé porque sinto e porque fiz da minha sensibilidade a minha matéria de estudo. Há sintomas no teu corpo que são incómodos mas são eles a porta aberta para a iluminação. Não os ignores, não te distraias, cura-te e ao fazê-lo estarás a curar toda uma linhagem, toda uma história que em ti é uma parte da história da Humanidade.
Que esta Páscoa avive a nossa memória e que este símbolo seja vívido na coragem de Amar. Que se finde a morte pela mão humana.